Num tempo remoto, num reino distante, nasceu um homem que, desde pequeno, sonhava possuir algo de muito valor na vida. Na sua infância deitava-se à sombra das árvores, imaginando...O anil dos olhos mirando o azul do céu, passava horas a fio idealizando poder e riqueza. Mais que isso, ambicionava conquistar aquilo que de mais grandioso sabia: a natureza em todo seu esplendor... Sua vida era planejar o futuro. Um futuro brilhante. Perdido em devaneios, carecia de tempo para notar as pessoas à sua volta.
Assim foi que passou-lhe despercebida aquela garotinha que, na espreita e silenciosamente, o observava, quiçá o admirando... Fato era ser belo este nosso jovem, e inteligente, e forte, e ambicioso. Primaveras e invernos passaram velozes e ele cresceu. Muito e muito lutou por sua prosperidade e poder...
E, de todos é sabido, que transformou-se de fato não só no mais rico, como também no mais poderoso e invejado Príncipe de todos os tempos, de todos os reinos. Suas façanhas alcançaram os sete cantos da terra. Tomou para si coisas nunca dantes conquistadas.
Em uma caixinha de ouro aprisionou o mais suave canto dos pássaros. Com cuidado guardou no baú o fino orvalho da madrugada. Num recipiente de madeira acalentou um sutil raio de sol. Arquivou as rebuscadas palavras e os sinceros sentimentos dos poetas.
Em uma das luxuosas salas de seu castelo armazenou as mais belas melodias de líricos menestréis. E, o mais assombroso, conseguiu aprisionar o lume das estrelas numa caixeta de cristal.
É bem verdade que o soberano passou anos felizes em seu castelo, alimentando-se de sua glória e fulgor... Assim foi até que um dia instalou-se um enorme vazio no peito.
Tinha poder e riqueza, honrarias e fama. Quase tudo com o que sonhara. Faltava-lhe algo inefável... Sim, uma presença companheira, alguém com quem pudesse compartilhar o sucesso. Passeando certa vez por seus imensos pomares, deitou-se melancólico à sombra de uma das árvores, para o límpido do céu apreciar. Recordou a época em que era apenas um menino e almejava obter tudo aquilo que agora lhe era real...
Subitamente pressentiu alguém espreitando-o, admirando-o, talvez... Olhou para os lados, vasculhou, mas nada viu. Era somente a vaga lembrança de uma menina travessa que se fazia presente. Teve o ímpeto de gritar o seu nome - qual mesmo seria ele? - e com ela conversar. Dizer de suas lutas e temores, mágoas e realizações...
Entretanto de nada adiantaria gritar. Sua tênue memória conseguia trazer de volta apenas a expressão dos olhos cor de mel daquela criatura longínqua.
Foi aí que percebeu, com tristeza, que nem mesmo o tremeluzir das estrelas em sua caixeta de cristal era tão enigmático, atraente e belo. Com amargura descobriu que seria o brilho daquele olhar o seu maior e mais valioso tesouro...
O único que, em tempo algum, preocupou-se em conquistar. Aquele que jamais haveria de ter. Ainda hoje, contam a história do Príncipe das Estrelas, como era conhecido este nosso personagem. A sabedoria popular acrescenta que, ao fazermos planos para o futuro, devemos cuidar para que neles não falte o lume dos olhos de alguém ao nosso lado. A trágica consequência deste esquecimento seria, sem dúvida, o maior de todos os sofrimentos:
A SOLIDÃO
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